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terça-feira, 5 de maio de 2020

Redação Internacional: o Brasil nas manchetes do mundo na semana de 26/04 a 03/05

                                           

Por Fernando Yazbek

     Três marcas tristes da pandemia do novo coronavírus foram alcançadas nesta semana no Brasil. Ultrapassou-se o número de 100 mil infectados, sendo mais de 7 mil mortos, o equivalente, em óbitos, a cem acidentes aéreos como o que vitimou o time da Chapecoense, no final de 2016. As mortes no Brasil ultrapassam a China, epicentro inicial da doença. Diferentemente da comoção que o país demonstrou com a tragédia do clube catarinense, as mortes pela covid-19 parecem ser, por mais numerosas que sejam, minimizadas por setores do poder público e da sociedade. A pandemia no contexto brasileiro é sempre noticiada junto dos cadernos políticos e econômicos de um governo que “menospreza” as mortes. Foi isto o que disse o jornal britânico The Guardian ao manchetar a insolente resposta “e daí?” do presidente Jair Bolsonaro quando perguntado sobre a crescente contagem de óbitos. 

        A matéria traz comentários de deputados oposicionistas, como o fluminense Marcelo Freixo (PSOL) que chamou Bolsonaro de “ser humano desprezível” além de ser um “péssimo presidente”. Nando Moura, músico ex-aliado do bolsonarismo, também aparece na reportagem classificando o presidente como um “sociopata”. Para além da pandemia e de suas consequências catastróficas nos mais pobres e nos índios brasileiros, The Guardian também noticiou reiteradas vezes a crise política nesta semana. 
        Carlos Bolsonaro (PATRIOTAS), o “zero três”, é vereador no Rio de Janeiro embora despache do Palácio do Planalto. O periódico lembra que o filho do presidente está sempre presente em todos os últimos “melodramas políticos” que põem o governo em cheque. A crise da saída de Sergio Moro do ministério da Justiça se deu pela vontade do presidente de nomear, para a chefia da Polícia Federal, Alexandre Ramagem, que é amigo de Carlos. O vereador é apontado como responsável pelo “gabinete do ódio”, uma organização para engajamentos favoráveis a Bolsonaro em redes sociais baseada na divulgação em massa de noticias falsas por robôs. Além de Carlos, o jornal lembra que Eduardo Bolsonaro, deputado federal, também tem seu nome aparecendo nas investigações das “fake news”. As tentativas do presidente de intervir politicamente na PF poderiam ter relação com a investigação de seus filhos. The Guardian diz que tentou contato com a assessoria de comunicação do presidente, mas que não obteve resposta. 
          Curitiba finalmente voltou às manchetes nacionais e internacionais depois de algum tempo sem operação Lava-Jato nem o ex-presidente Lula preso na cidade. O El País lembrou que a capital paranaense foi onde o ex-ministro Sergio Moro ganhou fama como “líder” de operações e movimentos anti-corrupção. “Do outro lado da mesa de interrogatório”, Moro depôs em Curitiba sobre as alegações que fez, em sua “inesperada demissão”  contra Bolsonaro, que por sua vez o chamou indiretamente de “Judas”.
            Ainda na imprensa espanhola, é feita uma extensa análise das forcas politicas de Moro, Bolsonaro e seus respectivos apoiadores que, anteriormente, formavam um corpo mais coeso no espectro ideológico. 

         O El País noticiou a interferência do Supremo Tribunal Federal quando a corte proibiu a nomeação do “amigo da família”, se referindo a Alexandre Ramagem. O jornal finaliza classificando a declaração “e daí” de Bolsonaro sobre as mortes da pandemia como “uma dessas réplicas que lhe deram fama quando era um deputado insignificante”.

        Na semana em que o presidente norte-americano Donald Trump falou do Brasil em três dias consecutivos em tom de preocupação, a mídia estadunidense noticiou principalmente o fracasso das negociações das empresas aéreas Boeing e Embraer. O The New York Times destaca a divergência nos discursos, já que o motivo apontado pela Boeing para o não fechamento do negócio é tido como “falso” pela empresa brasileira de aviação. Foram perdidos dois anos de conversações. OThe Washington Post, por sua vez, tratou das probabilidades da abertura de um processo de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro, que “acumula problemas” que vão desde a “negação do vírus” até as investigações que rondam sua família e aliados. O contexto, porém, é de total foco em políticas sanitárias, já que o Brasil pode ter “viveiro escondido” de casos de covid-19. 
        O vizinho La Nación trouxe uma extensa entrevista com o ex-premiê italiano Enrico Letta. O fundador do Partido Democrático da Itália defendeu a postura argentina no enfrentamento da epidemia, considerando que o país registra grande porcentagem de adesão ao isolamento social e pouquíssimos casos fatais. Para se ter uma idéia, são 237 argentinos mortos pelo coronavírus. No Brasil, são 7 mil, com 200 diários. Letta perpassa pela crise da globalização e pelos intercâmbios culturais e comerciais até comentar o caso brasileiro. O ex-primeiro ministro classifica Jair Bolsonaro como um “líder fracassado” que põe a imagem de todo o “gigante continente” da América Latina em “incômodo risco”, pagando pela má fama do brasileiro. Concordando com o italiano, o NY Times também compara o número de casos do Brasil com os países vizinhos. O Paraguai tem cerca de 250 casos confirmados e se esforçou “especialmente” em conter as fronteiras com o Brasil. O novaiorquino traz declarações do presidente argentino Alberto Fernández afirmando que o “Brasil me preocupa bastante”. O jornal ainda lembra a dificuldade que os EUA teriam em simplesmente proibir voos do Brasil por haver uma “enorme população e presença brasileiras” no estado americano da Flórida.

Na França, a agência de notícias AFP condenou o Brasil a ser o próximo epicentro da crise do coronavírus e o Le Monde sublinhou a incompatibilidade dos números oficiais da doença no Brasil. Mas nem tudo o que se leu sobre o Brasil no exterior foi necessariamente desesperador. O New York Timescriou uma coletânea de fotos intitulada “O Novo Sábado à Noite”, na qual mostra a nova rotina de entretenimento de quem teve que trocar as festas do fim de semana para ficar em casa.
 “fechada e escura” Itararé, na Bahia, fez com que a socialmente ativa família Almeida ficasse em casa, ora na janela, ora vendo novelas. A foto melancólica retrata bem o clima no Brasil. 
            Já o The Guardian reportou a rotina de músicos cujas apresentações foram canceladas devido ao novo coronavírus. Sem poderem tocar para multidões aglomeradas, os artistas não deixaram de levar suas canções para o público, que desta vez aplaude pela tela dos computadores. O curioso da matéria inglesa é que ela se focou em cantores e compositores marginais ao establishmentmusical e midiático brasileiro, fugindo dos grandes hits do pop e do sertanejo. 
            A cada semana que passa, fica evidente que a mídia internacional sobe o tom quando fala das políticas sanitárias de um Brasil mergulhado em crises orquestradas pelo governo. Longe do virtuosismo de João Gilberto, o país toca a questão da pandemia desafinado do resto do mundo. 

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