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segunda-feira, 17 de junho de 2019

Opinião - A (des)evolução do Brasil: mudança de status do país na OMC








Se eu pudesse te prender, dominar seus sentimentos, controlar seus passos, ler sua agenda e pensamento”. Aposto que quando escreveram esta frase em uma de suas músicas, Sandy e Júnior nunca pensaram que ela poderia ser tão bem empregada para descrever as relações comerciais entre Brasil e EUA tão bem. Que os dois presidentes atuais já vinham fazendo elogios mútuos já se era sabido. Afinal, ambos compartilham pontos em comum: (des)alinhamento ambiental, ideais (anti)migratórios e (des)informação a partir de fake news.

Mais recentemente, o domínio de sentimentos por parte dos EUA veio em forma de apoio internacional. O país anunciou o apoio ao ingresso brasileiro à OCDE- após quase voltar atrás em sua proposta - mas, em troca, o Brasil precisou deixar “sua agenda ser lida” e permitir que fossem controlado seus passos, abrindo mão de algo extremamente valioso:  seu status de país em desenvolvimento na OMC.  

Mas não coloquemos a carroça na frente dos bois. O que é a OMC? Onde vive? O que faz? Do que se alimenta?

Essas e outras perguntas serão respondidas agora.

A Organização Mundial do Comércio surgiu efetivamente apenas em 1995, apesar de ter sido idealizada ainda em 1947. Trata-se de uma organização internacional sediada em Genebra e que visa regular o comércio internacional. É de sua responsabilidade estabelecer acordos multilaterais que coloquem padrões normativos para diversos temas do comércio internacional; servir como foro de negociações para os Estados membros; estabelecer entendimentos a respeito de regras comercias e solucionar controvérsias.

É através das regras estabelecidas pela OMC que os Estados membros devem regular seu comércio, para fazer com que os princípios básicos do sistema comercial sejam atingidos. Atualmente, a organização conta com 162 países membros. Esta totalidade de membros representa quase todos os países do globo. Mas em um rol de Membros que possuem estruturas de governo, desenvolvimento e economia, como assegurar que todos possuam a mesma capacidade dentro do sistema multilateral do comércio?

Reconhecendo que isto é efetivamente impossível, foi estabelecido um sistema de Tratamento Especial e Diferenciado (TED), que prevê exceções dentro dos acordos da OMC para que países dentro da classificação de “em desenvolvimento” e “menos desenvolvidos” possam negociar em pé de igualdade. Caso contrário, como poderia o Peru competir igualmente com o Canadá? Fazer isso seria como colocar o Real Madrid e o Paraná Clube para jogarem juntos – com o máximo respeito aos torcedores paranistas.

 Assim, o TED reconhece que os países estão em estágios diversos quanto ao seu desenvolvimento e, por isso, permitem medidas como: maior tempo na implementação de medidas estabelecidas pela OMC; provisões que aumentam as oportunidade de comercio através de maior acesso ao mercado; provisões que estabelecem que os Membros devem salvaguardar os interesses destes países quando adotam medidas nacionais e internacionais e provisões que estabelecem meios de auxílio para estes países. Além disso, a OMC disponibiliza aos países que integram o TED um serviço de assistência jurídica para disputas e requerimento de consulta jurídica.

Foi deste status de país em desenvolvimento que o Brasil abriu mão em troca de uma recomendação à OCDE. Em nota oficial, o Itamaraty afirmou que essa mudança de status não irá ter incidência nos acordos já firmados na OMC. No entanto, isto significa que, daqui para frente, o Brasil não será mais considerado uma “liderança” entre os emergentes, de modo a capitanear o processo de negociação e busca por normas mais justas no comércio internacional. Além disto, não poderá se beneficiar dos custos de crédito internacional mais baixos; não terá prazos mais longos nas disputas futuras; perderá sua flexibilidade em acordos de livre comércio e não poderá mais fazer uso da “cláusula de habilitação” (permitia que os países desenvolvidos oferecessem tratamento mais vantajoso para os em desenvolvimento). Além destes efeitos, a longo prazo, o Brasil terá que arcar com uma maior contribuição monetária, acelerar reformas para que fiquem em conformes com os ditames da organização e, caso tenha sua entrada aprovada na OCDE, terá que alinhar políticas econômicas e ambientais as da organização.

Afirmar que podemos renunciar a este tratamento significa entender que somos capazes de competir em igualdade de condições com os países ricos. É como se o Paraná Clube desafiasse o Real Madrid, acreditando que poderia vencer!

Assim, nesse passe de mágica que supera os de qualquer fada madrinha ou gênio da lâmpada, o Brasil declara que virou um país desenvolvido. Com um bilhetinho do Itamaraty, entramos para o “clube dos países ricos”. Fácil né? Não sei porque ninguém pensou nisso antes...




Referencias:

 




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