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terça-feira, 7 de maio de 2019

Teoria das Relações Internacionais: Análise crítica sobre o Neo-realismo de Kenneth Waltz



Artigo apresentado na disciplina de Teoria das Relações Internacionais I, ministrado pela Profa Dra Janiffer Zarpelon, do curso de Relações Internacionais do UNICURITBA. As visões apresentadas no artigo não representam a opinião da instituição, mas sim dos seus autores.

* Amanda Marchiori de Souza Ramos                               

Kenneth N. Waltz discorre, em sua obra “Theory of International Politics” acerca da estrutura política que rege o sistema internacional. Para tanto, ele enxerga estrutura como um mecanismo no qual os Estados se organizam, ignorando, ou pelo menos abstraindo-se, das características das partes, dos seus comportamentos e das suas interações, entendendo que há a necessidade de concentrar a atenção na posição de uma unidade em relação às outras, ou seja, como estão organizadas ou posicionadas, proporcionando um caráter estático à estrutura, de maneira que, “apenas mudanças de disposição são mudanças estruturais”.
A fim de exemplificar ainda mais o conceito, Waltz traz em sua obra a ideia de que “A preocupação pela tradição e a cultura, a análise do caráter e a personalidade dos atores políticos, a ponderação dos processos políticos conflituosos e acomodativos, a descrição da feitura e execução da política - todos esses assuntos são deixados de lado (...). São omitidos porque queremos descobrir os efeitos esperados da estrutura no processo e do processo na estrutura”.
Contudo, não podemos entender o conceito de estrutura como algo estático, pois ele, por si só não se mostra como suficiente para acompanhar as mudanças no cenário internacional, pois, para tanto, é de exímia importância acompanhar, também, a capacidade de barganha, permuta ou negociação dos Estados abrangendo, dessa forma, um cenário político e dando relevância como as unidades se relacionam entre si (como interagem) e não somente como se organizam, dando origem à uma situação de princípio da interdependência, observando-se uma dinâmica na estrutura, fazendo com que os processos políticos estejam na base da análise, e não como uma consequência, entrando em contradição ao que Waltz afirma: “As estruturas políticas moldam os processos políticos”.
Ainda dentro do conceito de estrutura, Kenneth Waltz entra no mérito de separá-la em três características organizacionais, partindo do princípio de anarquia internacional, uma vez que não há um agente regulador central global, fator este desencadeador de conflitos, cooperação e sistema de “self-care”. A divisão é baseada em: Princípios ordenadores, Caráter das unidades e Distribuição das capacidades.
Incluso nos Princípios ordenadores, encontram-se duas fontes: a de subordinação e a de coordenação. A primeira é baseada em um sistema hierárquico, partindo da ideia de que alguns devem comandar, e outros obedecer, realidade esta vivenciada em políticas internas dos Estados, ao passo que contam com um governo central da união. Não obstante, tal estrutura conta com alto grau de diferenciação a partir da capacidade em que se está inserido, a exemplo da história desenvolvida por Suzane Collins, Jogos Vorazes, na qual a estrutura do país fictício criado pela autora, Panem, se mostra com alto grau de diferenciação por entre as partes regionais, favorecendo ao agravamento do desencanto das regiões, tornando a estrutura mais propícia à revoltas internas.  O segundo se enquadra no caso de anarquia, o qual rege os sistemas político-internacionais e tem relação com a cooperação, na qual os Estados, por serem soberanos, são semelhantes, mas não idênticos. Tal cenário pode ser relacionado à uma estrutura microeconômica, na qual, mercadores econômicos, assim como sistemas político internacionais, são formados por cooperações de partes egoístas, formando e mantendo o princípio em um sistema de auto-ajuda (self-care), de maneira que os Estados buscam assegurar sua sobrevivência como objetivo mínimo e perpetuar ou realizar a manutenção de seu status quo como máximo, reconhecendo que, “na busca de sua segurança nenhum Estado atua com conhecimento e sabedorias perfeitos”, resultando no posicionamento não favorável de Waltz perante as ideias de cooperação, de forma que, baseando-se no ideal de self-care, incertezas externas, falta de confiança e altas atividades em política interna, enxerga tal integração como insegura, não recomendável e uma forma de se preocupar mais com políticas externas do que com as internas, além da constante necessidade de garantias militares advindas de seu próprio Estado como resultado da insegurança do não conhecimento pleno das atitudes e intenções das demais unidades. 
Contudo, desviando um pouco das ideias trazidas por Waltz, um Estado contar com um elevado poderio militar não significa que ofensivas irão se concretizar, pois tais medidas podem trazer altos custos que as tornam ineficazes para alcançar seus objetivos, fazer a manutenção dos status quo e, até mesmo, sobreviver, servindo, muitas vezes, somente como formas de evitar ataques de demais países, ao passo que pode ser instaurado o medo da resposta.
O caráter da unidades reflete na determinação de acordo com o princípio de ordenação, ou seja, “a hierarquia impõe relações de superioridade e subordinação entre as partes de um sistema”, enquanto “a anarquia impõe relações de coordenação entre as unidades de um sistema, e isso implica na sua semelhança”, enquadrando um cenário de constante competição por entre os Estados, que acabam por diminuir sua produtividade, de forma que, segundo Waltz: “Os Estados são parecidos nas tarefas que enfrentam, apesar de não o serem nas suas capacidades para as desempenhar. Os Estados desempenham ou tentam desempenhar tarefas, a maioria das quais são comuns a todos eles; os fins a que aspiram são similares”. Contudo, ele entende que, em um sistema de anarquia, as divisões específicas requisitadas pelo caráter da unidade não é possível, já que os Estados, como soberanos, são semelhantes.
A última divisão se enquadra na Distribuição de capacidades, na qual, em um sistema anárquico internacional, as unidades são distinguidas a partir de suas capacidades para desempenhar tarefas similares, valendo ressaltar que, segundo Kenneth Waltz, a estrutura muda quando as distribuições das capacidades variam. Nesse sentido, quando há muitas unidades e as diferenças entre elas não são muito grandes (características parecidas no poder militar, comercial e outros), a competição  tende a ser generalizada, porém, quando somente um número restrito dessas unidades se destaca, favorece a formação de pólos (potências) no sistema.
Deve-se ressaltar, contudo, que, dentro da estrutura proposta por Waltz, a dinamicidade mostra-se ausente, ignorando a situação que, em um cenário de fim de Guerra Fria, à medida que a bipolarização perde força e a interdependência estatal é um resultado de novas visões, enquadrando, até mesmo, o enfraquecimento da descrição e retórica do discurso de “segurança nacional”, surge uma nova necessidade de legitimar ações e desenvolver capacidades, uma vez que fluxos e transições interestatais (comerciais, populacionais, bélicas e outras) implicam em custos e constrangimentos, assim como dizia Keohane e Nye, gerando uma nova interdependência e uma consequente mobilidade na estrutura política internacional, não somente dependente das alterações de capacidades estatais.
Waltz segue seu raciocínio e adentra à ideia de “Ordens anárquicas e balanças de poder”, a qual reconhece a necessidade dos Estados estarem preparados para usar a força, pois, caso contrário, estarão à mercê de vizinhos militarmente mais rigorosos, resultado este de uma situação de guerra que é o estado de natureza do homem como consequência do estado de anarquia a partir da ausência de um agente para gerir ou manipular as partes em conflito. Nenhum apelo pode ser feito à uma entidade superior revestida da autoridade e equipada com a capacidade de agir segunda a sua própria iniciativa. Situação essa exemplificada quando se faz  diferenciação de uma política interna da externa: “(...) um governo efetivo tem um monopólio no uso legítimo da força, e legítimo aqui significa que os agentes políticos estão organizados para evitar e para conter o uso privado da força. Os cidadãos não precisam se preparar para se defender. As agências públicas fazem-no. Um sistema político interno não é um sistema de auto-ajuda, O sistema internacional é.”
Dentro desse cenário de anarquia, Waltz ainda traz a interdependência como resultado da dependência de um país em relação ao outro devido à sua especialização em determinado ponto estratégico para a sobrevivência que ele não tem, de forma que, em um ambiente anárquico, as unidades semelhantes (que ainda se diferem muito em suas capacidades) cooperam; contudo, a realidade de um sistema de auto-ajuda faz com que grande parte dos esforços sejam direcionados à proteção em relação aos demais, pois permanece o interesse na segurança interna e sobrevivência enquanto há a falta de confiança para com as outras partes, prejudicando, assim, o enriquecimento mútuo como resultado de integrações mediante cooperação.
Seguindo essa linha de raciocínio, a medida que um Estado se especializa, maior se torna a necessidade de implementar cooperações devido ao aumento significativo de sua dependência perante as demais áreas que fogem de sua capacidade e, como resultado dessa maior interdependência, aos olhos de Waltz,  os Estados estão sujeitos à uma maior vulnerabilidade perante ao sistema de self-care e a falta de confiança e incertezas no cenário das relações internacionais.
Portanto, o ideal seria, num ambiente desorganizado, cada unidade ter a capacidade de tomar conta de si mesma, pois não pode confiar em mais ninguém para fazê-lo, entrando, dessa forma em um looping da Teoria dos Jogos, pois, “a busca do interesse próprio produz resultados coletivos que ninguém quer, contudo, os indivíduos ao comportarem-se diferentemente irão prejudicar-se sem alterarem as resultantes”.
Um cenário ideal seria de que o interesse internacional fosse servido, o que significaria na subordinação das vontades nacionais; contudo, a partir do comportamento racional, cada país é impelido a cuidar de si mesmo, não podendo, aos seus olhos, tomar conta do sistema internacional.
Contudo, apesar de o sistema de anarquia resultar na necessidade do self-care, a perspectiva de um governo mundial seria um convite para a preparação da guerra civil generalizada, assim como já mencionado quando citada a obra Jogos Vorazes, perante a crescente insatisfação das partes, pois, dentro de um sistema global com o poder centralizado, quanto mais poderosos  forem determinados Estados, maiores as chances deles aparecerem como ameaças aos outros, resultando na necessidade de um maior controle do governo central, porém, uma vez intensificada a concentração do poder, mais forte o incentivo para os Estados se envolverem numa luta pelo seu controle.
Dessa maneira, permanece o sistema anárquico, no qual, nacionalmente um governo trabalha em nome do direito e da justiça, porém, internacionalmente, a força de um Estado é empregue à própria proteção e vantagem, de forma que, o poder e as capacidades do mais forte é capaz de concretizar sua ações, impedindo o mais fraco de realizar conclamações, mas não porque o fraco reconhece a legitimidade perante o governo do mais empoderado, mas simplesmente porque não é sensato envolver-se com ele, na mesma medida em que o fraco pode gozar de certa liberdade de ações, pois elas não se mostrarão como ameaças à sobrevivência e manutenção do status quo do mais forte.
Vale-se ressaltar, também, que, apesar das incertezas no cenário internacional prejudicarem ações de cooperação e enriquecimento do sistema internacional, elas acabam, também por inibir conflitos, pois “a possibilidade constante de que a força será usada, limita as manipulações, modera as exigências e serve como incentivo para a resolução das disputas”.
Surgem, então, as balanças de poder, as quais se mostram como equilíbrio em que se chega entre dois ou mais Estados a partir da competição da distribuição de recursos que aumentam a chance de cada Estado de sobreviver no sistema internacional, dentro desse contexto, elas encaixam-se em duas fases: esforços internos (maneiras de maximizar as capacidades econômicas, aumentar a  força militar e desenvolver estratégias inteligentes) e esforços externos (como uma maneira de fortalecer e alargar suas alianças ou enfraquecer e encolher oponentes).
Dentro desse cenário, Waltz reconhece a balança bipolar a melhor forma de balança de poder, devido à sua previsibilidade por entre as ações de seus agentes, pois há um foco maior no ambiente doméstico e guerra entre eles se torna menos provável, estipulando uma coexistência pacífica, assim como ocorrido no período conhecido como Guerra Fria. O autor exemplifica essa situação em um cenário de que “O jogo externo de alinhamento e realinhamento requer três ou mais jogadores, e normalmente diz-se que os sistemas de balança de poder querem, pelo menos, esse número. A afirmação é falsa, porque num sistema de dois poderes, a política de balança mantém-se, mas a forma de compensar um desequilíbrio externo incipiente é, primariamente, intensificar os nossos esforços internos”.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                   
Contudo, tomando uma linha contrária ao autor, em um dinamismo do cenário internacional, uma balança multipolar demonstra uma maior distribuição de poder, quebrando um pouco a ideia de alianças ideológicas e a estaticidade de interesses, fazendo com que a diversidade por entre as hegemonias gere uma maior atividade no cenário internacional, movimentando divergentes interesses estatais e formando novas e diversificadas alianças e/ou cooperações.
Portanto, para Waltz, as balanças de poder mostram-se como consequências do sistema de auto-ajuda, pois a possibilidade da incapacidade de manter sua sobrevivência perante o medo à exposição do perigo, faz com que os Estados comportem-se de maneiras adequadas à formar as balanças de poder, de forma que “ se o propósito do Estado é favorecer uma balança, o propósito da balança é <manter a estabilidade do sistema sem destruir a multiplicidade dos elementos que o compõem>”, valendo ressaltar que estabilidade e a perpetuação da libra deve ser objetivo de todos os Estados envolvidos, para que assim as suas funções de estabilidade internacional e independências nacionais se concretizem, pois a política de balança de poder prevalece onde dois requisitos existem: que a ordem internacional seja anárquica e que seja povoada por unidades que desejam sobreviver.
A teoria descreve as relações internacionais como um domínio competitivo e o destino de cada Estado depende de suas respostas às ações de outros Estados, de forma que a competição produz uma tendência em direção à semelhança dos competidores a partir de um sistema anárquico e de soberania estatal.
Pode-se chegar à conclusão, portanto, que a balança de poder acaba por tornar-se um sistema de assimetria entre os Estados, pois o equilíbrio de poder dentro do cenário da lógica do comportamento das unidades estatais é uma consequência da propensão de cada país ampliar sua capacidade de maneira superior aos demais, de forma que a simetria jamais seria atingida, pois com agentes iguais em quesitos de poder e força não há razão para tentar algum movimento de equilíbrio, de maneira que a sobrevivência seria uma tarefa sem maiores ameaças e interferências externas. Portanto, mantendo-se a assimetria é possível manter, de certa forma, um sistema hierárquico dentro de um cenário anárquico (devido a algumas unidades que mostram-se mais empoderadas, capacitadas e influentes no cenário internacional), no qual a balança de poder mostra-se como o meio de perpetuação e sobrevivência dos países dentro da estrutura.

Referencias Bibliográficas:

WALTZ, Kenneth N. Teoria Das Relações Internacionais. Lisboa: Gradiva, 2002. Caps 5 e 6.


* Amanda Marchiori de Souza Ramos é estudante do curso de Relações Internacionais do Unicuritiba.                                 

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