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sexta-feira, 13 de abril de 2018

Direito Internaciona em Foco: CASO DO CANAL DO CORFU (Reino Unido vs. Albânia) – CIJ 1949






A seção "Direito Internacional em Foco" é produzida por alunos do 3° período do Curso de Relações Internacionais da UNICURITIBA, com a orientação da professora de Direito Internacional Público, Msc. Michele Hastreiter, e a supervisão da monitora da disciplina, Marina Marques. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores e não refletem o posicionamento da instituição.




CASO DO CANAL DO CORFU (Reino Unido vs. Albânia) – CIJ 1949

Camila Duda, Heloísa Orsatto, Lucas Beira e Suelyn Bidas
        
Ao longo do tempo, viu-se a necessidade da criação de um órgão, ou organização internacional para julgar e aplicar as medidas cabíveis em conflitos internacionais – entenda-se esses os que constituem-se com a presença de mais de um Estado-Nação com soberania própria.

Em meados da Idade Média, os conceitos de ‘guerra justa’ e a Paz de Vestfália, que encerrou a Guerra dos 30 Anos, foram as primícias deste mecanismo que viria a ser estabelecido somente após a 2ª Guerra Mundial, com a criação da ONU, em 1945. Desde então, disputas legais entre Estados podem ser submetidas à Corte Internacional de Justiça (CIJ), o principal órgão judicial das Nações Unidas.

O Incidente no Canal do Corfu em 1946 foi o primeiro caso a ser levado à CIJ (1947-1949) que resultou na reparação de danos de um Estado soberano para com outro – no caso, Reino Unido e Albânia.

O canal em questão se situa entre a Albânia e a ilha grega de Corfu, no extremo sul da Europa, próximo do leste costeiro da Itália. Em outubro de 1946, o Reino Unido, sem notificar previamente a Albânia, adentrou com seus dois navios nas águas territoriais albanesas. A marinha inglesa tinha informações de que a área não continha nenhum perigo, que havia sido examinada e checada em 1945. Foi quando um dos veículos colidiu com uma mina e ficou seriamente danificado. A segunda embarcação foi enviada para auxiliar o primeiro, e também colidiu com uma das minas, desencadeando uma explosão e ficando extremamente danificada, juntamente com a perda de 45 marinheiros ingleses e o ferimento de outros 42.

Ocorreu um outro episódio complicado nessa área, em maio de 1947, quando a Albânia interceptou dois navios britânicos, disparando na direção dos mesmos. Em um cenário pós Segunda Guerra Mundial, a Albânia justificou-se dizendo que navios de guerra não deveriam entrar em águas territoriais albanesas sem aviso prévio, contra o argumento do Reino Unido de que a passagem pelo Canal era garantida internacionalmente.

Depois das explosões, o Reino Unido enviou uma nota para a Albânia declarando que iria fazer uma limpeza no Canal, buscando a desativação das minas, e o governo de Tirana anunciou que não haveria consentimento, a menos que a limpeza fosse realizada fora das águas territoriais albanesas. Caso contrário, entenderiam como umaevera violação à soberania do país. O Reino Unido prosseguiu conforme declarado, sem autorização do país, e durante a limpeza identificou que 22 minas que estavam presas por cabos haviam sido cortados e encontrou também minas alemãs do tipo GY. Esta série de incidentes levou ao Caso do Canal de Corfu -  no qual o Reino Unido interpôs um processo contra a República Popular da Albânia à Corte Internacional de Justiça em 22 de maio de 1947.

Teria sido uma ação ofensiva por parte da Albânia? O Reino Unido alegou que sim. Além de exigir uma indenização pela perda dos navios e das vidas inglesas, o país alegava que a Albânia havia colocado as minas propositalmente ali, e se não dessa forma, quem quer que as tivesse colocado ali o fez com o consentimento do país. Fortemente repreendido pela CIJ, que acentuou a gravidade de uma acusação dessa dimensão sem a existência de provas concretas, o mesmo considerou que as minas que causaram o incidente, já estavam ali antes, ou seja, não havia sido uma ação proposital contra o Reino Unido.

Dessa forma ficou a indagação, a partir do que a Albânia seria julgada? O tribunal decidiu, então, analisar a conduta da Albânia antes e depois da catástrofe. A colocação de quaisquer minas, mesmo em território próprio, se fez em uma época em que existia uma rigorosa fiscalização, que geralmente implicava o uso da força, e também era requerida uma autorização para a implantação das minas, fatos que segundo a Albânia violavam indiscriminadamente sua soberania. Além do mais, o governo albanês se posicionou violentamente contra todas as investidas de entrada do Reino Unido com o propósito de limpar a região, não notificando o mesmo da existência das minas. O tribunal interpretou esse conjunto de fatos, como a vontade da Albânia de que tudo isso se mantivesse em segredo, uma omissão. Tal decisão ocasionou a ‘saída’ voluntária da Albânia do processo.

Resta ainda a questão da invasão do território marítimo albanês por parte do Reino Unido. Por definição “Território Marítimo consiste em águas regidas pela soberania do país, com alcance de 12 milhas (aproximadamente 23km) a partir de seu litoral” (Rezek,2000). Quanto a isso a explicação dada pela Albânia foi de que o Reino Unido deveria ter pedido autorização, pois há um princípio na comunidade internacional de que, em tempos de paz, é permitido outros países adentrarem com equipamentos militares, se for provado que a ação é inocente. Também definida por Rezek, ação ou passagem inocente “consiste na única restrição da soberania de um país em relação às suas águas territoriais. É definida pela passagem contínua e rápida de navios mercantis ou de guerra, desde que não demonstrem nenhuma ação ofensiva, como manobras militares, levantamentos hidrográficos ou coleta de informações. Submarinos obrigatoriamente devem navegar pela superfície”. A Albânia, no entanto, negou que a ação fora inocente. Com base no número de navios, suas manobras e sua formação, ela alegou que era uma missão de cunho político, com intenção de intimidação.

O Reino Unido disse que sua ação, com base em uma teoria de intervenção, tinha o objetivo de preservação das minas (antes que quem as tivesse colocado ali as retirasse) e que tudo isso foi feito para facilitar o trabalho da Corte Internacional. A CIJ disse que tal defesa não era válida e concluiu que o Reino Unido havia realmente violado a soberania da Albânia ao entrar em suas águas com equipamentos militares, sem seu prévio consentimento.     

No julgamento de 1949, o tribunal considerou a Albânia culpada pelas explosões, e o Reino Unido culpado pela ‘invasão’ ao território albanês. No que diz respeito a quantia da indenização, a Albânia foi condenada a pagar indenização ao Reino Unido, no valor de £844 mil libras, equivalentes hoje a £20 milhões, pela reparação dos navios e pelas vidas dos marinheiros ingleses. Quanto ao Reino Unido, este não sofreu nenhuma sanção pelo desrespeito a soberania da Albânia, na questão da soberania sob seu território marítimo.

Segundo Luiz Miguel Marrana, houve dois tipos de responsabilidade: uma por ação – por parte do Reino Unido em adentrar território albanês, sendo considerado uma afronta a sua soberania; e uma por omissão – da Albânia em não comunicar a existência ou o conhecimento de tais minas.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS     
https://www.dipublico.org/cij/doc/3.pdf
http://hmjo.tripod.com/Dip/Cases/Corfu.htm
http://www.icj-cij.org/en/case/1
Rezek, José Francisco Direito Internacional Público: curso elementar / Francisco Rezek. – 13. ed. rev., aumen. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2011. P. 353-356.
MARRANA, Luís Miguel. O regime da responsabilidade internacional dos Estados- Ponto da situação. Lusíada. Revista de ciência e cultura. Série de Direito. Universidade Lusíada do Porto. Porto: 2001. p.381.



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