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sexta-feira, 7 de abril de 2017

Redes e Poder no Sistema Internacional: O conflito no país mais pobre da Península Arábica e os desafios causados pela guerra no Iêmen


A seção "Redes e Poder no Sistema Internacional" é produzida pelos integrantes do Grupo de Pesquisa Redes e Poder no Sistema Internacional (RPSI), que desenvolve no ano de 2017 o projeto "Redes da guerra e a guerra em rede" no UNICURITIBA, sob a orientação do professor Gustavo Glodes Blum. A seção busca compreender o debate a respeito do tema, trazendo análises e descrições de casos que permitam compreender melhor a relação na atualidade entre guerra, discurso, controle, violência institucionalizada ou não e poder. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores, e não refletem o posicionamento da instituição.


O conflito no país mais pobre da Península Arábica e os desafios causados pela guerra no Iêmen

Mariana Benzoni *

O Iêmen se unificou em 1990, tendo como seu primeiro presidente o Ali Abdullah Saleh, que já ocupava o cargo de presidente do Iêmen do Norte desde 1978. Com a unificação e um território com grupos tribais muito diferentes, o governo desenvolveu uma estrutura administrativa que dava certa autonomia para cada região em troca de apoio ao governo, conseguindo assim governar a nação. Embora unificada, a República do Iêmen foi cenário de diversas revoltas, tanto pela situação econômica do país, quanto por motivos como a fome, a baixa no preço do petróleo, e por abrigar grupos étnicos e sociais bastante distintos entre si como os Houthis (muçulmanos xiitas), grupos separatistas do sul e, ainda, por abrigar uma das células mais ativas da Al-Qaeda.

Ainda que a insatisfação popular contra o regime já existisse com uma certa consistência, foi em 2011, durante a Primavera Árabe, que os habitantes do Iêmen se levantaram para lutar pela democracia e pelos problemas sociais do país. Os protestos começaram pacíficos e, embora o presidente Saleh fizesse algumas concessões para tentar sanar o movimento, as manifestações continuaram. Sem resultados efetivos em relação à diminuição dos protestos, o governo passou a combater os manifestantes com o uso da força. Em um ciclo de violência vinda de ambos os lados, houve a escalonamento do confronto. A violência aumentou e consequentemente a instabilidade política também, abrindo espaço para a tomada de diferentes regiões do território por diferentes grupos – houthis, separatistas do sul e Al-Qaeda.

As pressões internacionais fizeram com que o presidente Saleh aceitasse deixar o poder em troca de imunidade em relação as acusações de crimes de guerra – que aconteceram durante as manifestações. Seu vice presidente Abdu Rabbuh Mansur Hadi assumiu o poder durante a transição.

O governo de transição, com pouca participação nacional, convocou novas eleições e, sendo o único a candidato, Mansur Hadi foi eleito presidente da República do Iêmen. Embora o governo devesse tentar administrar as demandas e interesses de todas as diferentes tribos que compunham o Iêmen, a estrutura política do país se manteve bastante similar a do governo anterior, onde a elite era detentora dos poderes políticos e recursos naturais do Estado.

Hadi não conseguiu grande apoio popular das tribos, inclusive na sua região de origem, no sul do país; sem apoio, não foi capaz de administrar o país, consolidando assim a instabilidade. A sua conduta política dentro do novo governo pouco mudara em relação ao anterior, gerando novos protestos ainda mais intensos, organizados pelos houthis, que começaram a tomada de territórios no Iêmen, com intuito de aumentar sua participação no poder. Em 2015, o grupo foi ganhando espaço e Abdu Rabbu Mansour Hadi se refugiou na Arábia Saudita, quando a guerra civil iemenita se instalou.

A guerra fez com que a internacionalização do conflito fosse inevitável. À medida em que a Arábia Saudita, com um governo sunita, emitia esforços para conter os rebeldes para que esses movimentos não fossem usados como exemplos em outros países árabes da região, o que provocaria um conflito generalizado. Outro fator que havia contribuído para a aliança árabe, foi o crescente apoio do Irã – país xiita – aos houthis, fornecendo armamentos e apoio político.

A aliança saudita – que detém apoio dos EUA e países da União Europeia – promove bombardeios diários nas regiões em que os houthis e seus aliados se encontram. Por consequência desses ataques, o país está sendo destruído, reduzindo as cidades a escombros e abrindo espaço para a Al-Qaeda tomar territórios e se consolidar na região. Os EUA também promovem ataques em áreas dominadas pelos terroristas da Al-Qaeda. Esses ataques são realizados por drones, que apesar de tecnologia suficiente para acertar os alvos escolhidos, nem sempre o fazem, sendo inúmeros os ataques que acarretam a morte de civis.

A situação do país é bastante difícil, os hospitais, que já eram sucateados, não possuem medicamentos básicos para o tratamento de feridos e doentes e nem acesso à energia elétrica. Além disso, o acesso a produtos alimentícios e a água potável é pequeno, se instalando uma grave crise humanitária, visto que muitas pessoas passam fomes e estão em situação de desnutrição. A situação do país é agravada pelo embargo imposto pela Arábia Saudita, EUA e seus aliados, dado que aproximadamente 90% dos alimentos que abasteciam o país, eram importados.

Segundo o site de notícias Euronews, a absoluta maioria da população do Iêmen precisa de ajuda humanitária. Segundo o portal, “[o]s números da UNICEF dizem que 3 milhões de pessoas precisam de assistência alimentar imediata e 1 milhão e meio de crianças sofre de desnutrição”, sendo que o Iêmen já era considerado o país mais pobre da Península Arábica antes do conflito.

A pouca visibilidade dada ao conflito pode ter algumas explicações, já que sua localização não tem grande valor estratégico. Além disso, o embargo impacta diretamente na entrada e saída de pessoas do país, acarretando um número muito baixo de refugiados, não “incomodando” países centrais, fazendo com que a guerra e o sofrimento na região, fiquem muito distantes.

Além disso, a falta de informação sobre o conflito e a grave situação humanitária também são causadas pelo controle da informação no país, proibindo a divulgação de fatos ou acusando jornalistas de apoiarem a rebelião. A dificuldade de acesso à informação contribui para o conflito ser invisível a comunidade internacional.

Embora a mediação do conflito esteja acontecendo desde o início da guerra, nenhuma das partes parece disposta a negociar, um acordo parece distante e consequentemente o fim da guerra também.

* Mariana Benzoni é internacionalista, egressa do curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Curitiba (UNICURITIBA) e pesquisadora do Grupo de Pesquisa "Redes e Poder no Sistema Internacional".

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