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sábado, 2 de fevereiro de 2013

Tuaregues,terroristas e colonialistas : a crise no Mali






                                                                    Rebeldes separatistas tuaregues

Por Andrew Patrick Traumann*

No último dia 9 de janeiro o presidente francês François Hollande ,atendendo a um pedido do presidente malinês Dionconda Traoré enviou tropas a ex-colônia francesa. Há uma guerra civil em andamento entre separatistas tuaregues e radicais islâmicos pelo controle do norte do país desde junho de 2012. Os tuaregues querem a  a criação de um novo país, Azawad ,palavra de difícil tradução,mas que seria mais conhecida no meio rural brasileiro como invernada, ou seja,o deslocamento sazonal de rebanhos para locais que ofereçam melhores condições de vida em  determinada  época do ano,reflexo do estilo de vida  nômade dos tuaregues. Já  os islâmicos,outrora seus aliados contra o governo central, prometem estabelecer uma versão ao estilo talibã da Sharia em todo o país.

O Mali,antigamente conhecido como “Sudão Francês”,obteve sua independência em 1959,após, por um breve período, abarcar também os atuais territórios de Burkina Faso,Benin e Senegal. O  novo país enfrentou resistência de agrupamentos sociais pré-modernos que se recusavam a aderir ao novo projeto de governo. O mais significativo desses grupos são os tuaregues, que nunca foram totalmente subjugados pelo Estado. A região norte do país predominantemente  desértica e pouco povoada historicamente  foi alijada de investimentos tanto do governo local quanto de investimentos estrangeiros,o que fez da região uma das mais miseráveis do continente africano e alimentou o ressentimento tuaregue.

Portanto, assim como ocorreu em Ruanda com a divisão étnica entre hutus e tutsis e no Iraque com o sectarismo religioso entre sunitas e xiitas,no Mali os tuaregues sempre foram marginalizados  pelas maiorias urbanas como os songhais ,os bambaras e os árabes. O governo central explorou essas rivalidades, ora ocupando militarmente o norte, ora armando milícias e estimulando conflitos de baixa intensidade que se arrastaram por anos. Essa política persistiu até a entrada de armamento pesado no norte da África oriundo da invasão da OTAN a Líbia e da posterior entrada de membros da Al Qaeda no Mali que viam na desorganização do país uma base e um esconderijo.

Outra questão a ser levada em consideração são as riquezas minerais do país: o governo francês teme que caso vitoriosos os rebeldes rumem ao vizinho Níger e se apossem das minas de urânio exploradas pela multinacional francesa Aréva. Nunca é demais lembrar que a França tem na energia nuclear sua principal matriz energética. Na própria região norte do Mali,dominada pelos separatistas e pelos radicais, havia animadoras prospecções de urânio em curso antes da eclosão da atual crise.

É então que a  França, preocupada com as questões mencionadas acima,com a possibilidade do surgimento   de um rogue state às portas da Europa e contando com a aprovação da ONU,da União Europeia e da União Africana,passa a enviar as primeiros soldados ao país em operações conjuntas com o exército local. Tal intervenção tem o apoio da maioria da população, seguidora de  uma interpretação mais moderada do islamismo do que a professada pelos grupos insurgentes, formados em sua maioria por árabes  do norte da África. A intervenção na ex-colônia tem também o apoio de 75% dos franceses segundo o instituto de pesquisas BVA.

Evidentemente é impossível prever o que acontecerá daqui por diante no Mali,mas pode-se afirmar  que qualquer tentativa de estabilização do Mali passa necessariamente pelo estabelecimento de uma democracia verdadeira, que abarque a todas as etnias,sem privilégios. A justiça social é o principal antídoto ao discurso do radicalismo seja ele de matiz político ou religioso.

* Andrew Patrick Traumann é professor de História das Relações Internacionais do UNICURITIBA  e doutorando em História,Cultura e Poder pela UFPR.

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